sexta-feira, 30 de maio de 2008

Querida Marina

Querida Marina

FREI BETTO

Caíste de pé! Tu eras um estorvo àqueles que comemoram, jubilosos, a
tua demissão, os agressores do meio ambiente

CAÍSTE DE pé! Trazes no sangue a efervescente biodiversidade da floresta amazônica. Teu coração desenha-se no formato do Acre e em teus ouvidos ressoa o grito de alerta de Chico Mendes. Corre em tuas veias o curso caudaloso dos rios ora ameaçados por aqueles que ignoramo teu valor e o significado de sustentabilidade.

Na Esplanada dos Ministérios, como ministra do Meio Ambiente, tu eras a Amazônia cabocla, indígena, mulher. Muitas vezes, ao ouvir tua voz clamar no deserto, me perguntei até quando agüentarias.

Não te merece um governo que se cerca de latifundiários e cúmplices do massacre de ianomâmis. Não te merecem aqueles que miram impassíveis os densos rolos de fumaça volatilizando a nossa floresta para abrir espaço ao gado, à soja, à cana, ao corte irresponsável de madeiras nobres.

Por que foste excluída do Plano Amazônia Sustentável? A quem beneficiará esse plano, aos ribeirinhos, aos povos indígenas, aos caiçaras, aos seringueiros ou às mineradoras, às hidrelétricas, às madeireiras e às empresas do agronegócio?

Quantas derrotas amargaste no governo? Lutaste ingloriamente para impedir a importação de pneus usados e a transformação do país em lixeira das nações metropolitanas; para evitar a aprovação dos transgênicos; para que se cumprisse a promessa histórica de reforma agrária.

Não te muniram de recursos necessários à execução do Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia Legal, aprovado pelo governo em 2004.

Entre 1990 e 2006, a área de cultivo de soja na Amazônia se expandiu ao ritmo médio de 18% ao ano. O rebanho se multiplicou 11% ao ano. Os satélites do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) detectaram, entre agosto e dezembro de 2007, a derrubada de 3.235 km2 de floresta.

É importante salientar que os satélites não contabilizam queimadas, apenas o corte raso de árvores. Portanto, nem dá para pôr a culpa na prolongada estiagem do segundo semestre de 2007. Como os satélites só captam cerca de 40% da área devastada, o próprio governo estima que 7.000 km2 tenham sido desmatados.

Mato Grosso é responsável por 53,7% do estrago; o Pará, por 17,8%; e Rondônia, por 16%. Do total de emissões de carbono do Brasil, 70% resultam de queimadas na Amazônia.

Quem será punido? Tudo indica que ninguém. A bancada ruralista no Congresso conta com cerca de 200 parlamentares, um terço dos membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

E, em ano de eleições municipais, não há nenhum indício de que os governos federal e estaduais pretendam infligir qualquer punição aos donos das motosserras com poder de abater árvores e eleger ($) candidatos.

Tu eras, Marina, um estorvo àqueles que comemoram, jubilosos, a tua demissão, os agressores do meio ambiente, os mesmos que repudiam a proposta de proibir no Brasil o fabrico de placas de amianto e consideram que "índio atrapalha o progresso".

Defendeste com ousadia nossas florestas, nossos biomas e nossos ecossistemas, incomodando quem não raciocina senão em cifrões e lucros, de costas para os direitos das futuras gerações. Teus passos, Marina, foram sempre guiados pela ponderação e pela fé.

Em teu coração jamais encontrou abrigo a sede de poder, o apego a cargos, a bajulação aos poderosos, e tua bolsa não conhece o dinheiro escuso da corrupção.

Retorna à tua cadeira no Senado Federal. Lembra-te ali de teu colega Cícero, de quem estás separada por séculos, porém unida pela coerência ética, a justa indignação e o amor ao bem comum.

Cícero se esforçou para que Catilina admitisse seus graves erros: "É tempo, acredita-me, de mudares essas disposições; desiste das chacinas e dos incêndios. Estás apanhado por todos os lados. Todos os teus planos são para nós mais claros que a luz do dia.

Em que país do mundo estamos nós, afinal? Que governo é o nosso?" Faz ressoar ali tudo que calaste como ministra. Não temas, Marina. As gerações futuras haverão de te agradecer e reconhecer o teu inestimável mérito.

(FSP, 16.5.2008)

quinta-feira, 29 de maio de 2008

não foi por preguiça

Não, não foi, amigos e amigas.

A consciência pesou, mas mesmo assim não foi possível evitar esse tempo todo sem postar.

Os últimos meses têm sido ocupados por tarefa das mais desafiadoras aqui no SindBancários.

Propusemos a nós mesmo um desafio: construir um plano de carreira sob a ótica dos trabalhadores e pelos trabalhadores. Criamos um GT, que contou com a participação de dirigentes e delegados sindicais e com a assessoria do prof Schimidt (o Schimitão, atualmente candidato a reitor na UFRGS) e da psicóloga Tônia Duarte, tamb da UFRGS.

De outubro prá cá, construímos proposta de carreira que busca principalmente repensar a lógica instituída na empresa a partir de década de 1990 que objetiva moldar a Caixa à imagem de um banco privado - política de acordo com os governos neoliberais da época que levou à desconstrução de setores históricos (como a habitação) e estratégicos (tecnologia e recursos humanos) e à piora considerável do atendimento à população.

Isso gerou também, é claro, a criação de um clima interno que privilegia o estímulo à competitividade em níveis extremos entre os próprios colegas.

Ou seja, temos a clareza de que uma coisa é associada a outra. Não tem como se pensar carreira sem pensar o papel da empresa. A partir desse pressuposto, buscamos ultrapassar os limites da categoria bancária. Dito em outras palavras, buscamos fazer com que o bancário, ao discutir carreira, pense em algo mais além de seu umbigo.

Consolidando o caráter público da Caixa, acompanhada da visão de que de que seu principal papel é auxiliar o desenvolvimento social e eocnômico (inclusivo), e não apenas buscar o lucro pelo lucro, podemos repensar também a lógica interna ainda vigente.

Mas... É difícil convencer o próprio movimento sindical de que esse debate é importante. Seja porque alguns não enxergam nada além do umbigo (pensamento imediatista), seja porque muitos acham que, por ser governo Lula, não se pode reivindicar nada que a Caixa não esteja disposta a negociar.

De qualquer forma a contribuição está sendo dada. E o importante é que não ficamos apenas no GT: conseguimos fazer (e continuamos fazendo) muitas reuniões com os bancários, antes, durante e depois dos trabalhos do grupo. Ou seja, o método de construção da proposta foi bastante adequado.

E, com certeza, muitas sementes foram (e estão sendo) plantadas.

Bueno, um breve relato para dividir com vocês e ajudar a explicar a longa ausência.